Em continuidade ao texto de semana anterior, a segunda infância pode ser traduzida como a fase da socialização secundária, quando a criança faz as primeiras saídas do meio familiar para o meio escolar, como também para brincar com amiguinhos nos diferentes grupos sociais dos quais participa. Para Freud, os modelos de identificação da fase anterior e as fantasias da fase fálica devem adormecer e se tornarão latentes até que sejam requisitados pela puberdade. Freud chamou esta fase de Período de Latência, quando toda a libido será sublimada pelas atividades sociais. Assim a criança, na segunda infância, tentará compreender como funcionam as relações interpessoais, serão proativas e dispostas a manipular o mundo, serão atraídas por tarefas, descobrindo como funcionam. Enquanto na primeira infância a figura materna era a protagonista em quase todas as questões, agora entra em cena o pai, participando das brincadeiras, ensinando a andar de bicicleta, levando ao playground (para o descanso da mãe, rs), buscando ou levando à casa dos coleguinhas por ocasião dos aniversários e festinhas. O pai deve permitir que a criança se aproxime dele quando estiver realizando suas tarefas e, sempre que possível, mostrar que ela pode ser útil caso deseje ajudar.
Ao escrever este texto lembro-me de meu avô, que era homem simples e sempre estava às voltas com as tarefas do quintal. Quando elas não existiam, ele as inventava. Lembro-me de uma cena onde ele e nós, os netinhos, estávamos sentados à sombra de uma das árvores do quintal com um monte de cascalhos grandes ao nosso redor. Perguntei o que ele faria com aqueles cascalhos e ele apenas disse que precisava torná-los menor. Foi quando deu um martelinho na mão de cada um para que pudéssemos ajudá-lo. Nunca soube, na verdade, a utilidade daquela tarefa, mas lembro bem que passamos uma semana ali, ouvindo as histórias dele e martelando os cascalhos, felizes por estarmos ajudando o vovô. Este episódio poderia ser diferente se você imaginar um avô ranzinza dizendo “sai daqui menino porque é perigoso”, ou “não mexe no martelo, pois pode machucar o dedo”, ou ainda “vão para casa porque estão me atrapalhando”. Crianças nesta fase devem se aproximar dos adultos de referência para aprender suas histórias e habilidades. Na segunda infância é o momento adequado para se distribuir tarefas, do tipo: arrumar a cama, colocar a roupa suja no cesto, guardar os brinquedos após a brincadeira e outras coisas do tipo. Porém, quando os pais são inseguros, têm medo que a criança faça algo de forma errada, não permitindo sua aproximação com o mundo das realizações. Há casos de até os trabalhos manuais escolares, em grande parte, serem feitos pelos pais, pois os pais têm medo que os filhos fracassem, desconhecendo que o aperfeiçoamento das habilidades é uma questão de ensaio e erro.
Pais, nessa linha, não esperem perfeição nas realizações infantis, nem critiquem as crianças quando ficarem fora do padrão de qualidade do adulto, pois o desenvolvimento da percepção depende que você permita a própria criança, a seu tempo, aperfeiçoar a tarefa. Lembre do caráter didático de sua atuação. Aos sete anos de idade, fazem bem os pais que inserem os filhos em pequenas tarefas da casa, e eles terão gosto em mostrar que podem ser úteis. As primeiras tentativas devem ser ovacionadas independente do resultado, e nem ouse dizer, de início, que poderia ter ficado melhor se ela tivesse feito desse jeito ou daquele outro. é a repetição da tarefa, diariamente, que aperfeiçoará as habilidades da criança.
É importante compreender que cada fase, desde o nascimento, deve ser vivenciada adequadamente, pois será base para a fase posterior, em todos os contextos: afetivo, social e cognitivo. Na caminhada do desenvolvimento, tudo e todos estão interligados. E se você conhece uma criança que, na segunda infância, se destaca deste padrão (falo de uma criança que gosta de socializar, interagir, imitar e ajudar os mais velhos), você não está diante de uma criança problema, pois a criança é respondente, ou seja, responde ao meio em que vive. Nesse caso, a criança é apenas o sintoma de que vive em um meio inadequado. Mas isso é assunto para um próximo texto.
Como é bom adquirirmos conhecimentos. Aplicarei logo e aproveitar que o João ainda está na segunda infância.