56 – TIMIDEZ NO ADULTO, RAIZES NA INFÂNCIA?

Imagine um jovem introvertido, mas não uma timidez comum.  Algo que impossibilite o relacionamento social de forma significativa, principalmente, com o sexo oposto. Neste caso, a aproximação afetiva, apesar de desejada, dispara reações fisiológicas de nervosismo: a mão transpira, ficando molhada; a voz some, desaparecendo toda a coragem de avançar no relacionamento.  Foi assim que uma mãe descreveu seu filho para mim.  Nesta linha, vou fazer uma breve reflexão sobre o desenvolvimento psicossocial, ou seja, como as vivências da infância afetam as relações sociais na vida adulta.  No entanto, minha reflexão contemplará os casos não patológicos, ou seja, há pessoas excessivamente tímidas e que também tem um transtorno psiquiátrico. Neste caso este artigo não se aplica.

Quem bem descreveu os aspectos psicossociais o psicanalista Erik Erikson, que compreendeu o desenvolvimento humano a partir das relações sociais. Afirmou que o desenvolvimento passa por períodos críticos, ou seja, período onde um aspecto do desenvolvimento está em jogo. Então fica assim:

Do nascimento até, aproximadamente, uns dois anos, o bebê está vivenciando o período crítico onde está em jogo a confiança básica ou a desconfiança. O que isso quer dizer? Quando o bebê chora, está sinalizando suas necessidades, como alimentação, dor, calor ou frio. A mãe ou seu cuidador, que deve ser o mesmo, pelo menos no primeiro ano, deve atender a solicitação do bebê sempre.  Esta prontidão assinala, para o psiquismo em formação do bebê, que alguém cuida dele, que alguém se importa com ele, que ele é importante para essa ou essas figuras familiares. Lembre-se que com um ano, ainda não existe estrutura psíquica que possibilite  a  articulação de pensamentos, mas existe sentimento.  O bebê sentirá que o mundo é bom, que o mundo lhe recebeu bem e portanto que ele é bom.  Neste período o bebê e seu ambiente se confundem, ele é um com o ambiente. Sua percepção de mundo é formada na convivência da pessoa que cuida dele. Em um contexto ideal, espera-se que esta pessoa seja sua mãe.  A maternagem suficientemente boa, como dizia Winnicott, é o que o bebê precisa para se desenvolver de forma satisfatória. Correndo tudo bem, a criança se sentirá boa, amada, CONFIANTE.  Caso contrário, um sentimento de desconfiança básica intermediará os relacionamentos do adulto que ele se tornará, haverá uma dificuldade para confiar nos outros e em seu ambiente.

Entre dois e quatro anos, aproximadamente, a criança está entrando em outro período crítico, segundo a teoria de Erikson.  Daqui em diante, os passinhos cambaleantes se firmarão cada vez mais; frases que, às vezes somente os pais entendiam, se transformarão em linguagem compreensível a todos; o controle do cocô e do xixi está em franca elaboração, enfim, a criança está no contexto fisiológico, conquistando sua autonomia.  No final deste período estará falando, andando com desenvoltura e segurança, como também controlando o cocô e o xixi.  O desenvolvimento fisiológico e psíquico acontecem ao mesmo tempo, logo, também estará vivenciando estados emocionais de autonomia.  Por exemplo, quando a criança sobe até a metade de um escada e olha para os pais, está mostrando que já consegue aquela grande proeza.  Deveria ser ovacionada por seu feito, no entanto os pais não olham para a conquista da criança, mas para o possível perigo em subir a escada aos dois anos e meio. Assim, fazem um discurso, ordenando sua descida imediata, falando de um perigo que a criança não tem a menor condição de mensurar.  Pelo contrário, em uma cena como esta, a criança deveria ser retirada da zona de perigo, mas coberta de elogios, pois afinal de contas, foi uma vitória, uma escalada, uma demonstração de sua competência.  Em outras palavras, quando neste período crítico, onde a autonomia está em jogo e a criança é excessivamente repreendida, ela não tem maturidade para entender o porquê da repreensão e entenderá que seus feitos não são bem-vindos ao mundo.  Se sentirá inadequada naquilo que realiza, projetará sua agressividade como defesa, pois seus feitos se configuram como maus e improdutivos. O sucesso desta fase dependerá de como seu meio receberá suas realizações, lhe dando as dimensões de sua capacidade de produzir coisas boas e aceitas.  Com isso não estou dizendo que a criança não possa ser repreendida, mas os pais precisam transmitir uma ideologia que faça sentido ao mundo infantil.  Por exemplo, faltar com respeito a uma figura de autoridade é passivo de ser chamado atenção, quebrar uma vaso de planta por imperícia não.  Faz parte desta fase as discriminações coerentes do que é proibido e do que é permitido.   No entanto quando a criança é repreendida em tudo, e todas as coisas se tornam proibidas, desenvolverá dúvidas sobre suas habilidades e, envergonhada, se retrairá diante das relações sociais.

Concluindo, é neste período que as habilidades nas relações sociais se alicerçam e determinarão o tom das relações do sujeito na fase adulta.  Este assunto é muito mais extenso do que apresentei até aqui, porém é o suficiente para que se compreenda as hipóteses mais prováveis sobre a formação de adultos com traços de timidez, retraídos, com baixa autoestima, envergonhados, e coisas assim.

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