Existe uma longa caminhada entre a substância sem forma no ventre materno e o ser humano na idade adulta. Como eu já disse em outras postagens, ninguém nasce pronto. A constituição do sujeito passa por um processo, onde muitas variáveis estão se relacionando, como herança genética, família nuclear e periférica, vizinhança, e etc. Existem também aquelas variáveis intervenientes: escola, programas de televisão, redes sociais, dentre outras. Nossa personalidade, estrutura de EGO, enfim, tudo o que somos é conjuminação de todas estas variáveis ao longo da vida.
No entanto, é no período da infância e adolescência que estes fatores formatarão características que acompanharão o sujeito por toda a sua jornada. A maneira de lidar com as questões da vida, seja de forma combativa, corajosa, audaciosa, ou de forma tímida, retraída, discreta, dependerá das vivências infantis com as primeiras figuras de afeto e seu meio. Sendo assim, um sujeito com uma estrutura de EGO fraca vivenciará as pressões e frustrações de maneira inadequada, deprimindo-se até chegar ao fundo do poço ou agindo impensadamente.
Ocorre-me, agora, a história de um grande amigo meu, que posso usar como exemplo de interação pai-filho e seu legado. Vou chamá-lo pelo nome fictício de Zé, apesar de ter me autorizado a contar sua história aqui. Hoje, Zé é um empreendedor bem sucedido, já realizou vários tipos de negócios e até onde eu sei, sempre é recompensado por seu esforço. Mas o que me chama a atenção é que ele reconhece que sua habilidade no mundo dos negócios é devido aos ensinamentos de seu pai. Ocorre que o pai desse meu amigo morreu quando ele tinha apenas sete anos de idade e esse breve interstício foi o suficiente para formatar no meu amigo todo o potencial para negócios que vemos hoje. Nunca fez faculdade de economia, nenhum curso de especialização, nem esses cursinhos motivacionais para empreendedores. Tudo que aprendeu na tenra infância foi o necessário para ter o sucesso de hoje. Ele pode atravessar as crises e desenvolver métodos de crescimento nos mais variados cenários econômicos por onde passou. As lembranças afetivas de como os dois (ele e seu pai) eram unidos o acompanham até hoje. Enquanto me contava sua história, sua voz ía sumindo e seus olhos marejavam. Falava-me de um pai que revelava grandes segredos para o filho através das vivências diárias. Então, me contou que, no bairro onde morava, era comum as famílias colocarem os filhos no portão de casa, ao cair da tarde, com um tabuleiro ou uma espécie de casinha de madeira vendendo bombinhas, estalinhos, doces, etc. De fato, nos anos 70, estalinhos eram brinquedos bem populares entre crianças.
Zé era uma criança de sete seis anos aproximadamente, o único menino da família, e vender bombinhas para a vizinhança era sua tarefa diária.
É surpreendente pensar o que as lições daquele pai foram capazes de fazer pelo meu amigo anos mais tarde. Uma lição paterna valiosa e um tabuleiro de bombinhas fizeram dele o investidor bem sucedido que conhecemos.
O diferencial estava no pai de Zé, pois era proativo. Em todo momento, procurava extrair da sua experiência de vida lições para a vida do filho. Então, muito cedo para a grande maioria dos pais, mas no tempo certo no relógio do desenvolvimento, o pai de Zé, ao invés de recolher o dinheiro da banca de bombinhas, ensinou o menino como administraria os recursos investidos. Deu ao Zé três cofrinhos: __No primeiro cofrinho, você coloca a metade de tudo o que vender, a outra metade você dividirá ao meio novamente e colocará cada parte no segundo e terceiro cofrinho. Você usará o primeiro cofrinho para repor a mercadoria, o segundo será uma poupança para tempos difíceis e o terceiro é o teu salário. Todo mês, o que sobrar do seu salário, ou seja o quanto sobrar no terceiro cofrinho, deverá voltar ao primeiro cofre para investimento no próprio negócio, afinal, mais capital, mais produtos, mais vendas, mais lucros. E assim Zé cresceu e se tornou um empreendedor afortunado. A história de Zé é uma lição de administração na mais tenra idade. Aprendeu a organizar e controlar suas finanças, o que foi definitivo para o empreendedor que é hoje.
E quando falamos de ensinamentos plantados na infância, não temos somente os negócios para citarmos como exemplo. Vejamos a escolha de uma profissão, ou um namorado. É certo que os pais desejam ver os filhos seguindo suas vidas, que encontrem um rumo nos estudos, que tenham sua própria casa, que encontrem um parceiro idôneo, enfim, que sejam plenos e felizes. Porém, tudo isto implica em saber escolher. Ao contrário do que a maioria dos pais imagina, a oportunidade de escolha deve ser apresentada aos filhos ainda bem pequenos. Está frio, deixe que o pequeno escolha um entre dois ou três agasalhos. As escolhas devem sempre vir acompanhas de regras. Se, por exemplo, escolheu cachorro quente em vez de hambúrguer, deverá arcar com a escolha que fez. É importante vivenciar a frustração de uma escolha mal sucedida, aprendendo que terá chance de fazer diferente em outra oportunidade. Assim, de uma próxima vez, fará uma avaliação mais criteriosa, levando em consideração outros aspectos não observados anteriormente. À medida que se cresce, as escolhas precisam ficar mais complexas.
Muitas pessoas chegam na idade adulta sem saberem medir as consequências de suas escolhas ou fragilizadas demais para superarem eventuais frustrações.
O pior erro dos pais é desconhecerem o potencial didático que as circunstâncias possuem para o aprendizado dos filhos. O pai do meu amigo apostou em um pequeno tabuleiro, algumas bombinhas e três cofrinhos. E você, já pensou em algo? Seja lá por onde vai começar, saiba que a vida de cada um de nós é material riquíssimo de possibilidades.
Maravilhoso para o futuro de que ser bem sucedido!
Parabéns. Sua visão precisa e imparcial nos estimulam sempre a raciocinar.