39 – ADOLESCÊNCIA – Quem Volta Não Erra Caminho –

No texto trinta e sete abordo as raízes do fenômeno intitulado adolescência. Vimos  que, diferentemente do que possa parecer, a adolescência, tal qual conhecemos hoje, não tem origem no desenvolvimento biológico do ser humano, mas se trata de uma invenção humana, uma fase do desenvolvimento criada a partir da cultura, da mudança dos meios de produção,  oriunda de um conjunto de circunstâncias socioeconômicas que acarretaram, ao longo da história, transformações psicossociais nos indivíduos de certas sociedades. Isso mesmo que você está pensando: a adolescência não existia em sociedades de mais de cem anos atrás e não existe em todas os povos de hoje. Muitos confundem adolescência com puberdade. Puberdade, sim, é um aspecto natural da existência humana. Já a adolescência, embora, via de regra, desencadeada pela puberdade,  se constitui um fenômeno bem mais amplo, sobre o qual se debruçam hoje uma infinidade de conflitos e inquietações pautados em questões culturais, sociais e muitos interesses econômicos (carecendo este último aspecto de uma abordagem mais detalhada em outra oportunidade).

Em que pese a adolescência não ser um fenômeno natural, não a faz menos real do que as demais fases do desenvolvimento humano e, tão pouco, merecedora de menos atenção. Pelo contrário, o fato é que no meio em que vivemos, na sociedade da qual fazemos parte, a adolescência está em plena atividade, como aquele vulcão prestes a explodir. Então vejamos, no nosso contexto, o adolescente não é criança, mas também não é adulto. Trata-se de um ser indefinido sob o olhar da família, e igualmente indefinido para a sociedade.  São inúmeras as ambiguidades que o adolescente precisa resolver em sua mente. Precisa encontrar sua identidade em meio às mais diferentes formas de tratamento que recebe no curso das suas  relações sociais. Por exemplo: o adolescente é considerado apto a dirigir no Brasil a partir dos 18 anos, nos Estados Unidos 16, no Japão 20, na Inglaterra e Irlanda 17, na China 21. Comparando apenas esta categoria, já é um absurdo a discrepância de idades, pois adolescentes, aparentemente, deveriam ter tratamento igual em todo o mundo. Mas imagine que podemos ter uma discrepância ainda maior se compararmos a responsabilidade de dirigir com os outros tipos de responsabilidades dentro do próprio meio social em que este adolescente vive.  Frise-se que dirigir só aos 18, mas eleger vereadores, deputados, senadores e até o  presidente da república no Brasil basta ter 16 anos. Com menos de 18 o sujeito não sofre as penas do código penal, mas com menos de 18, muitas vezes, já se está cursando a universidade e, em outros casos, já está no cartório registrando um filho e exercendo o pátrio poder.   Com tanta ambiguidade no ar, podemos entender o tamanho da confusão que ronda a temática adolescente. E a pergunta que não quer calar é: e agora, o que eu faço?

Em primeiro lugar, não existe uma fórmula geral para resolver tal questão, cada família precisará descobrir a sua. Em segundo lugar, é compreender que se os pais forem bem resolvidos na área profissional, sexual e ideológica se sentirão menos ameaçados com as escolhas dos filhos, pois  “é a segurança do que somos e a coerência de nossas escolhas que nos permitem aceitar o que o outro é, e a escolha que faz” (Fiori, 1982 p.14). Em outras palavras, às vezes não é o adolescente que precisa de ir à terapia e, sim, os pais.

E em terceiro lugar, no senso comum, há vários ditos populares que são repetidos por várias gerações, sem que as pessoas se dêem conta que a sua permanência na cultura está ligada a algum tipo de sabedoria de relevante importância. Especificamente, refiro-me ao dito: “Quem volta não erra caminho.”

Pois bem, em todas as culturas “primitivas” se ouve falar de suas histórias com ritos de passagem. Cito alguns:  os ritos do nascimento, onde os recém nascidos eram apresentados aos seus ancestrais como membros do clã; os ritos da puberdade, nas meninas, por ocasião da primeira menstruação, anunciando que a jovem está apta a se preparar para o casamento e, nos meninos, por ocasião da primeira caça, abatendo o primeiro animal, indicando que os moços estão preparados para a vida produtiva e reprodutiva.  Tais momentos, eivados de simbolismos e significados, eram marcadores comportamentais, quando velhas atitudes eram abandonadas e novas atitudes deveriam ser aceitas.  Hoje em dia, mais especificamente nos meios urbanos, algumas cerimônias ainda existem, mas foram esvaziadas de seu conteúdo simbólico e, assim, se tornaram meros eventos sociais.

Por exemplo, o batismo cristão se tornou, para a grande maioria, uma obrigação social de levar o filho diante do sacerdote, sem nenhum compromisso de se manter a criança na fé de seus antepassados.  A festa de 15 anos para as meninas, ficou relegada a um dia diferente com vestido bonito, e não à marcação do início de uma nova fase na vida da jovem com novas obrigações, responsabilidades e compromissos.  Neste caso específico, quero dizer que os pais resistem à ideia de que seus filhos cresceram e continuam, após o evento comemorativo, os tratando como crianças e não como jovens adultos. A consequência disso já sabemos qual é: reclamações enlouquecidas, chamando-os de “aborrecentes”, preguiçosos, que ficam na rede social o dia todo, aluados, desatentos, nunca disponíveis, procrastinadores e por aí vai.

Bem, todo meu esforço é para dizer que vejo como uma possível saída para a problemática adolescente a conscientização dos pais quanto à importância de conhecer melhor as fases do desenvolvimento humano, as quais venho apresentando desde o texto 22 deste blog.    E, como eu disse anteriormente, “quem volta não erra caminho”, ou seja, nunca será tarde para se ampliar a consciência sobre a primeira e segunda infância, perceber, inclusive, quando um determinado comportamento de hoje tem eco em um erro nosso cometido lá atrás, conhecer e valorizar os ritos de passagem e seus significados, pesquisar e entender a importância do conteúdo psíquico do filho no decorrer de cada etapa da vida, para que, munidos de  tais conhecimentos, haja condições de se lidar de forma mais adequada com a complexidade desse momento tão relevante na vida do jovem adulto.

Muito há o que se dizer ainda, mas ficará para um próximo texto.

Um Grande Abraço.

1 thoughts on “39 – ADOLESCÊNCIA – Quem Volta Não Erra Caminho –

  1. Claudia Sampaio says:

    Sempre me surpreendo com seus textos e me incluindo neles. Realmente não é e nunca será fácil ser pais de adolescentes, porém, Como vc mesmo diz no seu conteúdo: ” quem volta, não erra” , e é por isso que aprendo retornar. Mas uma vez Obrigada!! !

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