66 – QUAL É A IDADE MAIS ADEQUADA PARA MATRICULAR UMA CRIANÇA NA ESCOLA?

Colocar ou não os filhos bem pequenos na escola? Essa dúvida é recorrente quando se discute a educação na primeira infância, abrangendo o período dos 0 aos 6 anos. Diante da diversidade de opiniões, experiências positivas e negativas compartilhadas com os pais, a escolha pode se tornar desafiadora. Portanto, é fundamental abordar esse tema, focalizando especificamente o aspecto psicológico, já que por trás da questão também se escondem nuances econômicas, políticas e ideológicas.

Para tomar uma decisão precisa, é fundamental considerar a fase afetiva que a criança está vivenciando. Essa é a chave. Ao compreender a onde a criança se encontra, torna-se mais simples optar pelo caminho mais adequado. A infância compreende dois grandes momentos: a primeira infância, que vai do nascimento até os 6 anos, e a infância tardia, que culmina com as transformações da puberdade, por volta dos 11 anos.

A primeira infância é particularmente primordial do ponto de vista psicológico, pois é nela que se estabelecem os principais traços de personalidade que influenciam as fases subsequentes e o desenvolvimento futuro da criança.

Portanto, durante a primeira infância, é fundamental que a criança tenha um cuidador exclusivo para garantir seu desenvolvimento adequado. Nos primeiros dois anos, especialmente, a pessoa que oferece esse cuidado deve ser preferencialmente a mãe, sendo a rede de apoio muito bem-vinda. O afastamento da mãe (ou cuidador que desempenha a função materna), nesse período, pode acarretar déficits afetivos, uma vez que, no início da vida, criança passa por uma fase denominada dependência absoluta, conforme descreveu Winnicott. Nesse ponto, a criança se entende fusionada a mãe, o “eu” ainda não existe, e tudo que a criança precisa é se sentir segura de que todas as suas demandas serão atendidas sem atrasos e com exclusividade. Todos os movimentos psíquicos que virão com o processo de maturação pressupõe um primeiro vínculo com a mãe incorruptível e indissolúvel. Nessa linha, o que esperar do desenvolvimento mental de um bebê que, tão cedo, tem esse vínculo “quebrado” ou “diminuído”. Imaginemos o que pode representar uma creche, ou escolinha, neste momento? Logo, é inadequado qualquer afastamento da criança e de sua principal figura de afeto nos 2 primeiros anos.

Após os dois anos, embora não haja mudanças drásticas, a ênfase muda para a autonomia da criança. Entre 2 e 3 anos, por exemplo, a criança ainda precisa da exclusividade da maternagem, mas está mais adaptada à presença da família e começa a explorar e compreender seu mundo, apesar de seu pensamento ainda ser predominantemente egocêntrico.

A ideia de colocar crianças na escola antes dos 4 anos como forma de socialização carece de base teórica sólida. Nesse sentido, Piaget argumentou que crianças mais novas, especialmente durante a fase pré-operacional do desenvolvimento cognitivo, tendem a ver outras crianças mais como objetos de suas próprias ações do que como parceiros igualmente capazes de interagir e colaborar. Portanto, a socialização primária oferecida pela família continua sendo indispensável e insubstituível nessa fase. Quando a criança é matriculada na escola durante essa fase, há uma perda significativa de tempo de convívio com a família, que é essencial para sua socialização primária. Isso ocorre porque a criança ainda não está psicologicamente preparada para ser inserida na sociedade fora do ambiente familiar. Ela ainda precisa passar por experiências estruturantes da primeira infância com sua família antes de estar pronta para lidar com as novas experiências que surgem na escola.

Aos 4 anos, a criança entra em uma nova fase de desenvolvimento afetivo, marcada por identificações com os pais e uma maior consciência de si mesma. Entre os 5 e 6 anos, conclui-se a primeira infância, com os principais traços de personalidade já formados e a gênese da sexualidade estabelecida. A esta altura, do ponto de vista psicológico, a criança está pronta para interagir fora do ambiente familiar, ou seja, na escola.

A decisão de matricular uma criança na escola antes do término da primeira infância pode ter consequências complexas, pois pode subtrair tempo precioso de convivência familiar, essencial para a construção do caráter e do desenvolvimento moral e social da criança. Portanto, a escola precoce não afeta apenas a criança, mas também a estrutura social como um todo.

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